RONDÔNIA

Ponte na BR-364, uma das principais rodovias do país, corre risco de colapso

Laudo do Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura (CREA-RO) aponta alto risco na ponte e reflete cenário de perigo nacional

Ponte sobre o rio Candeias, na BR364, está em dinâmica de siga e pare desde o dia 1º de maio por risco de colapso na ponte  -  (crédito: Divulgação MPF/RO)
Ponte sobre o rio Candeias, na BR364, está em dinâmica de siga e pare desde o dia 1º de maio por risco de colapso na ponte - (crédito: Divulgação MPF/RO)

Desde o começo do mês, uma ponte que fica na principal rodovia federal que liga Rondônia e o Acre ao restante do país, está parcialmente interditada e operando de forma intermitente, na dinâmica siga e pare. A estrutura da ponte sobre o Rio Candeias, na BR-364, está comprometida e corre risco de colapso, conforme laudo do Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura de Rondônia (CREA-RO). 

O problema verificado atualmente na estrutura da BR-364 aponta para um cenário nacional de risco e relembra tragédias brasileiras como a queda da ponte da BR-226, que ligava o Maranhão ao Tocantins, e caiu em dezembro do ano ado, deixando 10 mortos; ou a queda da ponte na BR-319 em setembro de 2022, que matou cinco pessoas. 

Em conversa com o Correio, o engenheiro Edison Rigoli, presidente do CREA-RO afirmou que a malha viária do país está sendo prejudicada de forma ampla em função do aumento do peso dos caminhões. "Os veículos eles vêm transportando suas cargas cada vez em quantidades maiores. Era muito comum antigamente ter carretas com 40 toneladas. Hoje já chegamos a carretas bitrens com quase 80 toneladas. Então, a carga existente nas pontes, nas rodovias aumentou muito e todas elas estão sofrendo com isso.
Não só as pontes aqui de Rondônia, mas de todo o Brasil, a malha viária brasileira tá sofrendo com isso. isto. É uma carga dinâmica, né, que você a ali e se cada vez maior. Então, não há limitação porque as balanças rodoviárias não são utilizadas no Brasil. Os CREAS do Brasil todos são preocupados com a relação às manutenções das pontes", afirmou. 

A travessia sobre o rio tem grande tráfego de veículos pesados, pois a BR-364 é um dos principais corredores de grãos do país, com fluxo anual de 10 milhões de toneladas, segundo o Ministério dos Transportes. Até o começo do ano, duas pontes atendiam à demanda do trânsito local, sendo uma no fluxo que segue para a capital e a outra no sentido oposto. Mas a ponte que levava para Porto Velho acabou interditada em janeiro por "não oferece condições seguras de tráfego", segundo nota do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transporte (DNIT) enviada ao Correio. Com isso, o fluxo foi totalmente transferido para a outra estrutura, que agora também corre o risco de ceder em curto espaço de tempo.

Conforme o laudo do CREA-RO, existe grande risco de colapso da ponte em função dos problemas detectados. "Após a vistoria visual da ponte, foi identificado um risco significativo de colapso devido à continuidade da utilização e à presença de deformações excessivas e patologias progressivas observadas na estrutura. As deformações aparentes indicam que a ponte está submetida a tensões excessivas, que podem comprometer a sua integridade a curto prazo”, conclui o laudo técnico ao qual o Correio teve o.

Após o laudo do CREA-RO, o Ministério Público Federal em Rondônia (MPF-RO) recomendou que o DNIT providencie recuperação urgente da ponte, incluindo reforço estrutural, substituição de materiais comprometidos e monitoramento contínuo das condições da ponte.

  • Laudo realizado pelo CREA-RO na ponte sobre o rio Candeias, na BR364 mostra fissuras na estrutas
    Laudo realizado pelo CREA-RO na ponte sobre o rio Candeias, na BR364 mostra fissuras na estrutas CREA-RO
  • Laudo realizado pelo CREA-RO na ponte sobre o rio Candeias, na BR364 mostra fissuras na estrutas
    Laudo realizado pelo CREA-RO na ponte sobre o rio Candeias, na BR364 mostra fissuras na estrutas CREA-RO
  • Laudo realizado pelo CREA-RO na ponte sobre o rio Candeias, na BR364 mostra fissuras na estrutas
    Laudo realizado pelo CREA-RO na ponte sobre o rio Candeias, na BR364 mostra fissuras na estrutas CREA-RO
  • As deformações aparentes indicam que a ponte está submetida a tensões excessivas, que podem comprometer a sua integridade a curto prazo, afirma o laudo do CREA-Ro sobre a ponte da BR364, sobre o rio Candeias
    As deformações aparentes indicam que a ponte está submetida a tensões excessivas, que podem comprometer a sua integridade a curto prazo, afirma o laudo do CREA-Ro sobre a ponte da BR364, sobre o rio Candeias CREA-RO
  • Conforme o laudo do CREA-RO existe grande risco de colapso da ponte em função dos problemas detectados.
    Conforme o laudo do CREA-RO existe grande risco de colapso da ponte em função dos problemas detectados. CREA-RO
  • Conforme o laudo do CREA-RO existe grande risco de colapso da ponte em função dos problemas detectados.
    Conforme o laudo do CREA-RO existe grande risco de colapso da ponte em função dos problemas detectados. CREA-RO
  • As deformações aparentes indicam que a ponte está submetida a tensões excessivas, que podem comprometer a sua integridade a curto prazo, diz o laudo do CREA-RO
    As deformações aparentes indicam que a ponte está submetida a tensões excessivas, que podem comprometer a sua integridade a curto prazo, diz o laudo do CREA-RO CREA-RO
Em uma reunião realizada pelo MPF com o CREA-RO e a Polícia Rodoviária Federal, na segunda-feira (26/5), o DNIT confirmou que está realizando ações como a intercalação de veículos leves e pesados para reduzir a sobrecarga da estrutura. E também ficou acertado entre os presentes, o reposicionamento do ponto de controle “Pare e Siga” para as cabeceiras da ponte.

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Em nota ao Correio, o DNIT informou que os serviços emergenciais para recuperação da ponte estão em andamento. O órgão afirmou que o prazo para conclusão de reparos é de um ano. “O projeto prevê a reabilitação completa das pontes com uso de tecnologia extradossada — sistema semelhante ao das pontes estaiadas — que utiliza cabos externos para reforçar a superestrutura, proporcionando maior estabilidade e vida útil às obras. O prazo contratual das ações emergenciais é de um ano. Contudo, os trabalhos podem ser concluídos antes. O DNIT pede a compreensão dos usuários da BR-364 durante o período de execução da obra. Importante destacar que algumas interdições noturnas podem ocorrer para movimentação de equipamentos”, informou o órgão.

Impactos da interdição da ponte da BR-364 para população

O modelo "Siga e pare" é o mais seguro no momento, para evitar o colapso definitivo da ponte, mas tem gerado problemas para quem a pelo local constantemente.

O taxista Josimar Raquebaque, 36 anos, atua no trecho de 202km entre Ariquemes (RO) e Porto Velho há seis anos. Diariamente, ele leva pessoas do interior para a capital para cumprir agendas de trabalho, pegar voos, ou comparecer a compromissos de saúde, como consultas médicas ou exames.

Ele conta que a viagem, que normalmente durava no máximo duas horas, aumentou muito. “Hoje, o tempo de viagem está indefinido. Porque um dia você demora mais, às vezes, menos um pouco. Três horas é o mínimo que você gasta, mas eu já cheguei a gastar cinco horas nesse trecho que é de 200km. Às vezes, a gente fica uma hora só pra cruzar a ponte, já chegando em Porto Velho”, relatou o profissional ao Correio.

Ele afirma que, para evitar que os ageiros percam os compromissos na capital, a estratégia é sair muito cedo. “Eu já alerto quem vai viajar comigo: uma pessoa que tem compromisso às 14h eu já aviso que vou sair às 5h, que é para a pessoa não perder o compromisso”, conta.

Ele ainda critica a demora das atividades do governo e chama atenção para os acidentes que têm ocorrido na região em função da parada na ponte. “Já houve vários acidentes nesse lugar com morte. Teve um caso de um caminhão que veio e sem perceber que o outro estava parado bateu atrás. O motorista morreu”, lamentou.

Na segunda-feira (26/5), horas antes da reunião no MPF, um mototaxista morreu ao ser atropelado por uma carreta perto da ponte sobre o Rio Candeias, a alguns metros da fila do "Siga e pare". Já na quinta-feira (22/5), um carro bateu em um caminhão que estava parado e ficou totalmente destruído, deixando o motorista ferido. 

O Panorama CNT de Acidentes Rodoviários mostra que a BR-364 é a rodovia mais mortal da Região Norte. Dos 537 acidentes fatais registrados em 2024, 17% ocorreram na BR-364. No estado, a rodovia também é a mais crítica, concentrando 73% dos acidentes rodoviários registrados em Rondônia. No ano ado, o gasto total do estado com acidentes de trânsito ultraou R$ 323 bilhões, segundo a Confederação Nacional do Transportes. Muitas pessoas chamam a BR-364 de Rodovia da Morte. 

Problema da ponte na BR-364 não é isolado

O Panorama Geral das Pontes Brasileiras, estudo realizado por entidades técnicas e engenheiros, com base em dados do DNIT, aponta que pelo menos 11 mil pontes no Brasil estão em condição ruim. Já a CNT localizou, em 2024, nove trechos críticos em rodovias federais em função de pontes caídas. Destas, somente metade estavam em obras no momento da realização da pesquisa.

Os perigos relacionados às estruturas de pontes no país estão na rota de alerta da Associação Brasileira de Pontes e Estruturas (ABPE) que emitiu, no começo deste ano, após a queda de uma ponte entre Tocantins e Maranhão — que deixou uma dezena de mortos — um Manifesto pela Segurança e Manutenção das Pontes Brasileiras.

Em entrevista ao Correio, o diretor da Associação, Carlos Henrique Siqueira, afirmou que, no Brasil, existem dois principais problemas sobre a manutenção de pontes: o primeiro é a falta de cultura de inspeção e o segundo diz respeito à falta de orçamento para realizar as fiscalizações. 

“Nós não temos cultura neste país de manutenção das nossas pontes. Alguém tem ideia do patrimônio rodoviário de pontes brasileiras?", indaga. "Há uma regra internacional que diz o seguinte: ‘Você deve gastar por ano, na vistoria e manutenção das pontes, 2% do valor atualizado da obra’ Muito bem. Nos Estados Unidos, eles já fazem tanta manutenção que esses 2% já baixou para 0,5% por ano. Na Europa, está em 1,5%; no Japão, 2,5%. No Brasil, está em torno de 30%, quando não 50%, ou a demolição completa da obra, porque não pode mais reforçar, porque não tem mais jeito", denuncia.

"Como os Estados Unidos resolveram esse problema? Em 1967, a Silver Bridge, sobre o Rio Ohio, colapsou e matou em torno de 46 pessoas. Então, o próprio Senado e a Câmara se juntaram e resolveram. Todo ano tinha no orçamento deles tinha uma verba carimbada e destinada só para isso. Quando a gente vai ter isso no Brasil?”, questiona o engenheiro.

O diretor da ABPE reivindica que o DNIT atue com os recursos que tem, mas seria necessária uma mobilização nacional, com integração de Poderes, para mudar esse cenário e garantir segurança em toda malha viária, especialmente nas pontes.

Siqueira é enfático ao afirmar que o caminho para resolver essa questão é manter um orçamento específico para fiscalização e manutenção de pontes no país. O engenheiro afirma ainda que a norma NBR 9452/2023, vigente no Brasil, exige fiscalização periódica de pontes, mas, segundo ele, o monitoramento não é feito na frequência exigida.

Em nota ao Correio, o DNIT afirma as ‘Obras de Arte Especiais (OAEs) de toda malha rodoviária federal recebem inspeções rotineiras, por meio de contratos específicos’ e que um plano de ação é realizada de acordo com as necessidades de cada local.

“Há um plano de ações contínuas e as inspeções são realizadas com base no normativo técnico do DNIT, levando em consideração as necessidades de ações preventivas e corretivas levantadas nas averiguações, que auxiliam nas tomadas de decisões e priorização dos investimentos", afirma o departamento.

"As OAEs são submetidas a serviços de manutenção preventiva, um conjunto de atividades necessárias para o cumprimento da vida útil da estrutura. As atividades incluem recuperação estrutural, limpeza e desobstrução de dispositivos, substituição de juntas de dilatação, dentre outros, ou serviços de reabilitação, quando são necessárias intervenções de maior vulto para adequação da estrutura às necessidades atuais, sejam elas funcionais (largura, número de faixas, gabarito, dentre outros) ou estruturais (necessidade de reforço, inclusão de novos elementos, dentre outros)”, continua o texto. O órgão disse ainda que está em andamento um novo ciclo de inspeções em todo o país, para aprimorar a gestão e o monitoramento de pontes.

O Tribunal de Contas da União (TCU) também analisa a situação das pontes no Brasil e realizou uma consulta pública para avaliar a gestão da manutenção das pontes federais pelo país. No total, 485 respostas foram enviadas e as três considerações apresentadas sobre pontes em Rondônia apontaram para avaliações ruins. Entre elas, está a ponte sobre o Rio Candeias. Segundo o TCU, os dados enviados vão balizar uma auditoria abrangente que será realizada para analisar a gestão de manutenção de pontes em rodovias federais.

postado em 31/05/2025 04:00
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