"Dor no coração." Assim, a aposentada Zumira Casimiro, 65 anos, resumiu o sentimento de receber, pela tevê, a notícia da morte do papa Francisco. O pontífice faleceu ontem, aos 88 anos. Na capital, a principal homenagem a Francisco ocorreu na Catedral Metropolitana de Brasília, cuja missa, antes dedicada ao aniversário da cidade e da Arquidiocese, lembrou o legado de humanidade do argentino. "Brasília está de luto", completou a fiel, com o terço em mãos.
A missa reuniu cerca de 3 mil pessoas, entre autoridades e fiéis — muitos, bastante emocionados, preferiram o silêncio. "É um momento difícil. Perdemos até as palavras", comentou um seminarista, cabisbaixo. Zumira, que permaneceu sentada no canto da igreja mesmo depois da cerimônia, lembrou que o papa enxergava a dor do outro de um jeito diferente dos demais, de forma especial. "Sentíamos que ele fazia parte do povo, porque tinha percepção do sofrimento dos mais necessitados e excluídos. Acolhia", comentou a católica.
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Antes da cerimônia, o arcebispo de Brasília, cardeal dom Paulo Cezar Costa, fez um pronunciamento solene na Cúria Metropolitana, relembrando a importância do papa argentino para o mundo e destacando sua simplicidade e seu compromisso com os mais pobres. O arcebispo, que foi nomeado cardeal da Igreja Católica por Francisco, confirmou que irá a Roma para o sepultamento do pontífice, cuja data ainda não foi divulgada oficialmente pelo Vaticano.
"Eu me encontrei com o papa antes da Jornada Mundial da Juventude, no ano de 2013, depois convivi durante uma semana, e ali nasceu essa proximidade mais profunda entre nós, meu carinho por ele, o carinho dele também por mim. Papa Francisco sempre me chamava pelo nome e, até na doença, manteve seu espírito brincalhão. Lembro que, um dia, disse a ele o quanto Brasília era uma cidade bonita, e ele respondeu 'por isso te mandei para lá'", disse dom Paulo Cezar, bastante emocionado.
Homem de diálogo 4u1s3o
Mais tarde, após a missa, o arcebispo destacou o forte papel político e social de Francisco. "Não canso de dizer que o papa foi um homem que apontou as principais questões do mundo, como as migrações na Europa, a questão ecológica e o cuidado com os mais pobres e necessitados. Ele deu voz àqueles que não a tem, como as periferias esquecidas, o continente africano e os injustiçados pelas guerras", descreveu. Dom Paulo ainda definiu o pontífice como um líder que prezou pelo diálogo.
"Ele tentou mostrar que os problemas do mundo não se resolvem com a força, mas com o diálogo, o que chamava a cultura do encontro", ressaltou. Dentro da igreja, Francisco não teve receio de abordar assuntos delicados, "as chagas da vida interna da instituição, como a pedofilia". Para o argentino, a igreja deveria ser uma saída e um espaço que fosse ao encontro das "periferias humanas e existenciais. Nós perdemos um pai", concluiu o arcebispo.
Na catedral, os momentos de oração silenciosa, cantos litúrgicos e discursos de fé foram marcados pela presença forte do espírito franciscano: simplicidade, compaixão e compromisso com os mais vulneráveis. Maria Otaviano Campelo, 71, não segurou as lágrimas ao relembrar os encontros com o papa nas três vezes em que participou da Jornada Mundial da Juventude (JMJ). "Não pude deixar de vir a missa rezar por ele e para que ele esteja intercedendo pelos jovens, o nosso futuro. A experiência que tive ao conhecer Francisco e fazer parte desse evento foi linda, nunca esquecerei", contou.
A moradora do Guará destacou que, diferentemente dos demais líderes religiosos, o argentino prezou pela união das igrejas. "Com tanta violência no mundo, devemos estar unidos e não multiplicando a hostilidade. É preciso ter paz nos corações", acrescentou Maria, que pretende manter o papa em suas próximas orações.
Assim como Maria Otaviano, a aposentada Ivanildes Gonzaga, 73, também teve a oportunidade de encontrar o papa na JMJ, ocorrida no Rio de Janeiro, em 2013. "Quando eu soube que o papa Francisco faria o trajeto completo no evento, em meio ao público, meu coração tremeu, pensei 'estou nessa!'. Chegando ao Rio, vi a praia e me encantei, mas o que me emocionou mesmo foi vê-lo ar entre as pessoas. Lá, mergulhei naquela misericórdia. Oro para que ele esteja, agora, em um bom lugar e agradeço pelas graças que nos concedeu", contou a moradora de Santa Maria, que participou de toda a missa de joelhos.
Legado de humildade 4m4g4p
O Governo do Distrito Federal (GDF) decretou, ontem, sete dias de luto oficial pela morte do papa Francisco. Em discurso na Catedral Metropolitana, o governador Ibaneis Rocha (MDB) lamentou o falecimento do pontífice, relembrando as duas ocasiões em que o encontrou pessoalmente. "Fiquei marcado pela sua humildade e pelo olhar de candura e benevolência que sempre manteve. Na última ocasião, em novembro, pediu que orássemos por ele."
Pelas redes sociais, o governador deixou mais uma homenagem a Francisco. "Cheguei a manifestar, em carta, o desejo de tê-lo conosco para as festividades dos 65 anos de Brasília. Embora sua presença física não se realize, sabemos que seu legado espiritual permanecerá: como um farol de justiça, clemência e amor aos pobres", relatou. "Descanse em paz, papa Francisco. Que os anjos o conduzam ao encontro do Bom Pastor que ele tanto amou", finalizou Ibaneis.
Presente na celebração, a vice-governadora do Distrito Federal, Celina Leão, falou sobre a perda de Francisco com emoção visível. "A comunidade cristã do Brasil todo, e do mundo todo, recebe com muito pesar. Ele foi um papa totalmente diferente, ele deixou vários ensinamentos. Falou sobre humildade, sobre uma igreja preparada para receber as pessoas que mais precisam de Cristo. E é isso que eu acho que é o grande legado dele."
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