Podcast podEnvelhecer

Influenciadora Cris Pàz conta como enfrenta o processo de envelhecimento

Para Cris Pàz, menopausa é um dos principais desafios. Convidada do podcast podEnvelhecer, ela também fala sobre envelhecimento, preconceito, machismo, luto e muito mais

Cris Pàz é a convidada do podcast podEnvelhecer -  (crédito: Fotos: Reprodução)
Cris Pàz é a convidada do podcast podEnvelhecer - (crédito: Fotos: Reprodução)

Cris Guerra ou a ter projeção nacional no início dos anos 2000 com o blog Hoje vou assim, no qual postava diariamente o “look do dia”. Ganhou voz ao contar a própria história: uma publicitária de Belo Horizonte apaixonada pela escrita que se viu viúva a dois meses de parir o único filho, Francisco. Tornou-se escritora e, depois dos 50 anos, emprestou a sua fala para também combater o etarismo. Mais que isso: cansada de “guerrear demais", deixou de ser Cris Guerra para se tornar Cris Pàz. Ela é a convidada do terceiro episódio do podcast podEnvelhecer, e às jornalistas Carmen Souza e Sibele Negromonte falou sobre envelhecimento, preconceito, machismo, luto, menopausa e muito mais. “Costumo dizer que o etarismo nada mais é do que um prolongamento do machismo”, resume a escritora. Confira trechos da entrevista.

Você foi uma das primeiras influenciadoras brasileiras de visibilidade. Nesse período, se reinventou várias vezes. Como é envelhecer diante dos holofotes? 

Eu sempre falei sobre a minha vida, sobre assuntos que me tocavam. Então, quando eu fui chegando aos 50, a partir dos 45, comecei a falar mais. E, aos 50, eu levei um susto, porque eu não me sentia com 50 anos. E, aí, entendi que a gente mitifica muito o envelhecimento. Comecei a me deparar com o meu próprio etarismo, que está dentro de mim, que é o mais difícil de combater.

E o etarismo dos outros? Como uma mulher que se mostra nas redes, você acaba virando alvo. Como lida com isso?

Costumo dizer que o etarismo nada mais é do que um prolongamento do machismo. A gente já tem tantas exigências em relação a nós. Nunca estamos suficientes, mesmo aquela pessoa que tenta se encaixar no padrão — aí, o padrão muda. É um sistema muito cruel. E, no caso do envelhecimento, é muito pior. Se a gente vê os homens, no cinema ou na vida real, pensa: ‘como ele está charmoso’; ‘cabelo branco, que lindo’; ‘essa barriga está charmosa’. No homem, tudo é perdoado, a barriguinha, o cabelo branco. E na mulher, nada é. Essa é a lógica. Mas se eu pegar como isso aconteceu na minha vida, talvez eu esteja mais preparada para ser mais livre durante o envelhecimento porque eu precisei me libertar de algumas coisas muito cedo. Eu era muito criticada em casa, então, me sentia inadequada em tudo. Um dia me libertei, (falei) vou cortar o cabelo, vou ser diferente. Ser diferente não é ruim. Então, acho que eu fui fazendo as pazes e ficando um pouco mais livre e corajosa. Claro que eu vejo isso retroativamente, não foi um planejamento estratégico. Mas isso também me dá uma permissão para ficar mais tranquila durante o envelhecimento. Trazer o cabelo branco, que eu usei durante quase quatro anos, foi mais tranquilo. É claro que eu tenho os meus conflitos, minhas questões de autoestima. Não sei se sou mais corajosa, mas sou mais topetuda para algumas coisas. 

Sibele Negromonte e Carmen Souza em entrevista com Cris Pàz para o podcast podEnvelhecer
Sibele Negromonte e Carmen Souza entrevistam Cris Pàz no podcast podEnvelhecer (foto: Reprodução)

Qual é o impacto disso nas outras pessoas?

Isso acaba ajudando a autorizar outras mulheres. Eu fico feliz porque, quando eu falo sobre a minha vida, eu falo muito mais sobre minhas vulnerabilidades, e acho que são elas que fazem com que as pessoas se identifiquem comigo. E não olhar: ‘ah, a Cris fez sucesso’. As pessoas olham para as vulnerabilidades, vão se identificando e entendendo que, com vulnerabilidades, dá para continuar seguindo. Claro que não é igual para todo o mundo. A gente tem que reconhecer o lugar de privilégio que a gente tem, que também é uma coisa que ao longo do tempo fui aprendendo. Mas é claro que a gente precisa lutar pelos nossos direitos, porque não é todo o mundo que consegue quebrar barreiras. Eu brinco que quebrei os paradigmas porque senão eles me quebravam. Eu fui indo e deu certo. Mas isso não é uma fórmula.

Como os momentos mais difíceis, como ter ficado viúva grávida, influenciaram nesse processo?

A minha vida se resume a uma briga com o tempo. É como se o tempo sempre corresse de mim. Acho absurdo uma pessoa conseguir ficar viúva grávida, né? É uma subversão do tempo absurda. Minha avó também tem essa história. A minha mãe tem a mesma história do meu filho. Mas, antes disso, eu também me sentia como se eu estivesse sempre no tempo errado. Na minha casa, eu era nova demais, por isso que o envelhecimento, talvez, tenha me impactado tanto. Como assim, eu era a mais nova e agora eu tenho 50 anos? Agora eu tenho 54 e, muitas vezes, sou mais velha do que muitas pessoas com as quais eu convivo. Como é isso? Eu estou sempre fora do lugar? E me tornar uma mulher viúva na gravidez, de ser mãe tendo perdido um grande amor, de viver uma alegria e uma tristeza, a despeito de todo esse sofrimento, também me trouxeram muito aprendizado para falar: ‘gente, a vida é difícil mesmo’. A vida é difícil para cada um de  forma diferente. Cada um tem uma história. E se apossar da nossa história é muito poderoso, porque a gente começa a ficar mais potente pra viver a partir de então. A minha viuvez durante a gravidez me transformou muito. Então, esses sofrimentos, na verdade, foram grandes escolas. Meu filho hoje está com 18 anos e eu já me casei várias vezes, já tive todos os estados civis.

O envelhecimento também traz uma proximidade com o luto. E o etarismo está muito ligado a uma resistência em lidar com o fim das coisas…

É uma série de lutos que você vai enfrentar, é mais uma carga para se levar nesse processo. A gente, que sempre cuidou de todo o mundo, se vê muito sozinha. A menopausa é uma espécie de luto, né? A adolescência é o mundo se abrindo, quando a gente fica menstruada, agora eu posso ter filho, vou me casar. Foi assim que a gente aprendeu. E a menopausa é o contrário: não posso mais engravidar, não tenho mais utilidade para a sociedade. Em 2023, tive que tirar o útero porque não conseguia fazer reposição hormonal, porque tinha um sangramento uterino. Isso me ajudou no meu bem-estar. E é maravilhoso. Você não guarda a embalagem depois que você ganha um presente. Francisco já veio, sou muito grata ao meu útero, ele já cumpriu a função dele. A gente precisa ressignificar as coisas, mas isso não significa romantizar. Porque, sim, envelhecer é enfrentar cada vez mais lutos. É o luto da menopausa, do filho que cresce e vai para longe, dos amigos, das pessoas que a gente vai perdendo. Não vai doer menos, o que acontece é que a gente está mais preparada para lidar com essa dor. Eu falo que, cada vez que uma pessoa que eu gosto morre, eu não choro só por ela, eu choro por ela e por todas as minhas dores. E acho que isso é positivo, que bom que eu estou chorando. A vida é cheia de tristezas, mas o envelhecimento traz uma coisa muito legal, que é quando parece que você aprende a viver. 

O que diria para as mulheres que estão entrando agora na menopausa? 

É importante procurar um médico ou uma médica que esteja atualizado sobre a menopausa. Até outro dia, ninguém estudava a menopausa. Em 1962, uma mulher entrava na menopausa, em média, aos 57 anos e tinha uma expectativa de vida de 59. A menopausa era o fim da vida. Hoje, a gente entra na menopausa, em média, aos 51 e vive até os 80. A gente precisa cuidar da nossa saúde. Eu tenho me cuidado muito mais do que me cuidei a vida toda. Mas tudo dentro de um certo equilíbrio, porque senão a vida fica muito chata. Costumo brincar que a gente come uma maçã por dia para viver mais, mas o chato é que você vai ter que viver mais anos para comer mais maçã todo o dia.

A menopausa foi também quando a guerra virou paz?

Engraçado, não foi uma coisa pensada, mas, se você olhar para trás, é daí que veio. Na psicanálise, eu comecei a entender que Cris Guerra, meu nome de batismo, que eu adoro, que era o nome do meu pai e tal…, (parece) que eu estou sempre de farda. Eu perdi minha mãe aos 24, meu pai aos 31, me casei, tive dois abortos, me separei, aí comecei a namorar de novo, encontrei o homem da minha vida, engravidei sem querer, fiquei superfeliz e, quando eu tinha sete meses de gravidez, ele morreu. Poxa, são muitas guerras. Chegou uma hora que eu falei, estou cansada de pegar o limão e fazer uma limonada, uma batida de limão, uma torta de limão, eu não sou fábrica de limonada. E aí eu comecei a pensar no significado da palavra guerra e falei, vou procurar uma numeróloga… E aí eu coloquei o Pàz no meu nome. Então, o meu nome ficou totalmente equilibrado. Meu nome era Cristiana de Souza Guerra, hoje é Cristiana de Pàz de Souza Guerra. Existe um significado mesmo, a conquista da paz. Não sou de guerra, eu sou de paz. Quando precisar, eu vou guerrear, porque, às vezes, até para conquistar a paz você precisa fazer guerra. Mas acho que tem a ver com a pessoa que eu sou hoje, muito mais pacífica, o que o próprio envelhecimento traz.

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FRASES

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Envelhecer é enfrentar cada vez mais lutos. É o luto da menopausa, do filho que cresce e vai para longe, dos amigos, das pessoas que a gente vai perdendo"

Quando precisar, eu vou guerrear, porque, às vezes, até para conquistar a paz você precisa fazer guerra. Mas acho que tem a ver com a pessoa que eu sou hoje, muito mais pacífica, o que o próprio envelhecimento traz"

postado em 26/05/2025 05:00
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