
As profissões tradicionais estão sendo ressignificadas e novas ocupações surgem a cada dia, acompanhando as transformações tecnológicas que remodelaram o mercado de trabalho e, no Distrito Federal, não é diferente. Especialistas ressaltam que essas mutações exigem novas habilidades dos profissionais e empreendedores e, por isso, os setores têm buscado compreender como essas transformações impactam as especificidades de cada segmento. Segundo eles, a indústria do serviço e a bioeconomia têm se destacado na capital do país.
A Secretaria de Desenvolvimento Econômico, Trabalho e Renda (Sedet) lançou, recentemente, a primeira turma do Projeto Labinclui, com 120 vagas, para capacitar pessoas para esse mercado de trabalho, com cursos voltados à área tecnológica (confira o quadro). O secretário da pasta, Thales Mendes Ferreira, afirma ser fundamental que trabalhadores e os gestores estejam sempre atentos e preparados para os desafios e oportunidades que a inovação traz. "Ela redefine processos, aumenta a eficiência, mas também exige novas competências dos profissionais", ressalta.
De acordo com o secretário, o GDF reconhece a importância de preparar a população para esse novo cenário. "Por meio dos programas oferecidos pela Sedet, promovemos qualificação, que desenvolve as habilidades técnicas e comportamentais alinhadas às demandas do mercado", pontua. "Além disso, utilizamos uma plataforma chamada "e-Trabalho", desenvolvida pela e para a Sedet, que faz o mapeamento do perfil dos trabalhadores e nos direciona a políticas públicas mais eficazes", acrescenta Mendes.
Professora que trabalhou no Centro de Apoio ao Desenvolvimento Tecnológico da Universidade de Brasília (CDT/UnB), Cristina Castro afirma que o Distrito Federal possui uma característica muito interessante. "Por ser a capital do país, onde se tem a istração pública e, até então, as pessoas eram muito focadas em prestar concursos públicos, aos poucos, começa a se desenvolver tudo o que o setor público precisa à sua volta", comenta. "Com isso, temos a indústria do serviço, além da bioeconomia. Empresas de tecnologia que precisam estar perto do governo ou que estão focadas em logística começam a ter representantes aqui", avalia.
De acordo com a especialista, o DF começa a se desenvolver no entorno de políticas públicas. "Olhar para a inovação de políticas públicas é pensar em tudo que é desenvolvido para o cliente final, visando à modernização e ao desenvolvimento de setores que, até então, eram tradicionais e que precisam ser pensados de maneira tecnológica", explica. "Ou seja, o mercado de trabalho de inovação, em Brasília, está muito focado no olhar futurístico", acrescenta.
Campo promissor
A jornada de Luana Ribeiro, 22 anos, é marcada por desafios e superação. Criada entre Santa Maria e Ceilândia, Luana sempre estudou em colégios públicos, incentivada pela mãe a frequentar as melhores opções disponíveis. No entanto, o o à tecnologia era limitado e seu primeiro contato com um computador ocorreu apenas no ensino médio, por meio de um projeto social que oferecia cursos gratuitos de técnico de informática, o que despertou seu interesse pela área.
Ao ingressar na faculdade, as dificuldades se intensificaram. A falta de um computador próprio no início e a diferença na bagagem educacional, em comparação com alunos de escolas particulares, impactaram seu desempenho em diversas disciplinas. Apesar dos obstáculos, Luana está agora na reta final do curso e trilha seu caminho profissional. "Atuo como estagiária na área de teste de software, com grandes chances de ser contratada", torce. "Tive o apoio da minha mãe durante todo o processo. O auxílio dela veio desde a escola, ando pela faculdade e dura até hoje", afirma.
Olhando para o futuro, Luana enxerga a engenharia de software como um campo promissor e de grande abrangência. "A área envolve programação, gerência de projetos e ibilidade digital. A tecnologia está onipresente na sociedade moderna, desde eletrodomésticos como máquinas de lavar e ar-condicionado, até campos avançados, como a inteligência artificial", observa. Ela ressalta que a engenharia de software é uma área em franco crescimento no Distrito Federal e que oferece boa remuneração.
Mudança inevitável
A diretora superintendente do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) no Distrito Federal, Rose Rainha, afirma que as rápidas mudanças tecnológicas estão redesenhando o mercado de trabalho e exigem novas competências dos profissionais e empreendedores. "Enxergamos essas transformações como oportunidades para a inovação, o aumento da produtividade e a criação de novos modelos de negócio", observa.
Segundo ela, o avanço da inteligência artificial e da automação é visto pelo Sebrae como uma mudança inevitável e estratégica. "Sabemos que essas tecnologias podem representar desafios, como a substituição de certas funções, mas também trazem enormes oportunidades: possibilidades de ganho em eficiência, redução de custos e personalização do atendimento", aponta Rose Rainha.
Por isso, de acordo com a diretora, o Sebrae atua como um agente de conexão entre as tendências tecnológicas, a inovação e os pequenos negócios, oferecendo orientação, capacitação, consultorias e soluções, como participação em feiras e eventos que permitem aos empreendedores acompanharem e se adaptarem a esse novo cenário. "Estamos ao lado do empreendedor, oferecendo soluções como capacitações presenciais e on-line, consultorias especializadas, missões técnicas nacionais e internacionais, além de conteúdos atualizados sobre tendências de mercado, tecnologia e gestão", ressalta.
Juliana Nóbrega, especialista em mercado de trabalho e coordenadora do curso de istração e do Ceub Carreiras, acredita que os diversos setores têm buscado compreender como as mudanças tecnológicas impactam as especificidades de cada segmento (leia mais em Três perguntas para).
Desafio aceito
A paixão de Rafael Mascarenhas, 26, pela área tecnológica, especialmente robótica e programação, não surgiu de imediato, mas um interesse que "foi se construindo" ao longo do tempo. Ao contrário de seus amigos e cofundadores da empresa de robótica Br.ino, Gabriel e Victor Pacheco, que tinham familiaridade com eletrônica e circuitos, Rafael, mesmo sem saber "nada" inicialmente, aceitou o desafio de participar da Olimpíada Brasileira de Robótica, começando pela montagem de Lego, enquanto aprendia programação e, posteriormente, a lidar com eletrônica (como o Arduino). "Foi esse processo de aprendizado contínuo e o envolvimento nos projetos que me fizeram apaixonar pela área", comenta.
Essa paixão pela tecnologia se casou com o desejo de gerar um "impacto um pouco mais direto na sociedade", buscando algo além da construção de grandes sistemas ou aplicativos. A educação, que "sempre foi uma paixão" e algo que ele praticava, uniu-se ao gosto pela tecnologia e à percepção de uma necessidade, consolidando o caminho que levou à criação da empresa, cujo propósito é unir tecnologia e educação. "A nossa missão, de 2017 até hoje, sempre foi democratizar o uso da tecnologia", afirma.
Atualmente, a Br.ino concentra suas ações em escolas, tanto na rede particular quanto na pública, implementando projetos que vão desde a montagem de espaços Maker e fornecimento de materiais até a capacitação de professores e a participação de alunos na Olimpíada Brasileira de Robótica. "A educação tecnológica deve ser engajadora e divertida, mostrando aos alunos o valor da programação em diversas áreas da vida e promovendo o letramento digital", ressalta Rafael Mascarenhas.
Capacitação
As primeiras turmas do Projeto Labinclui são para os cursos de:
- Equipamentos assistivos;
- Impressão 3D e suas tecnologias;
- Manutenção de cadeiras de rodas;
- Confecção de órtese e prótese;
- Introdução ao desenho industrial de órteses e produtos assistivos.
Fonte: Sedet
Três perguntas para
Juliana Nóbrega, especialista em mercado de trabalho e coordenadora do curso de istração e do Ceub Carreiras
Como o mercado de trabalho do DF está se adaptando às rápidas mudanças tecnológicas?
Tem sido interessante observar as trocas de experiências e as decisões colaborativas, em busca de uma inteligência coletiva e mais sistêmica nesse conselho. Outro ponto importante é como a academia, o setor de educação como um todo, responsável por fornecer mão de obra qualificada ao mercado de trabalho, também tem se esforçado de forma ágil para atualizar os currículos e os percursos formativos dos estudantes em todas as áreas do conhecimento. O foco da educação é promover experiências educativas diante das novas demandas de competências tecnológicas e pensamento computacional, formando profissionais prontamente aptos a responder às exigências do mundo do trabalho.
E sobre o avanço da inteligência artificial e da automação?
Isso deverá impactar todas as atividades profissionais mais operacionais, o que não é um movimento novo. A novidade agora é a celeridade da inserção das tecnologias e a forma como alguns trabalhos realizados por seres humanos simplesmente deixarão de existir. Outro ponto também novo nesse processo é que, pela primeira vez na história, estamos vendo as máquinas realizarem trabalhos criativos e estratégicos. Claro que já usamos tecnologias de apoio nessas áreas há algumas décadas, mas elas não eram extensão das capacidades, decisões e reflexões humanas. Estamos estabelecendo novas relações humano-máquina no âmbito do trabalho, e precisamos compreender novas acepções de inteligência e de ética profissional.
Quais são as novas profissões em ascensão e as que estão se transformando, por causa disso?
As profissões nas áreas de tecnologia continuam em crescimento. Quanto às transformações, não consigo ver profissões que não serão impactadas, todas estão se modificando e continuarão ando por mudanças significativas. Acredito, no entanto, que isso valorizará ainda mais a dimensão do trabalho que envolve relações humanas. Na área da saúde, por exemplo, o foco do trabalho humano não está mais no diagnóstico, mas na atenção ao paciente. Outra mudança importante que prevejo é que, de alguma forma, todos nós seremos, em alguma medida, “engenheiros de prompt”, com especialização nas especificidades do nosso campo de atuação. O nosso trabalho não será exatamente executar tarefas, mas sim dar bons e corretos comandos para que as tecnologias as realizem.
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