
José Natal, jornalista
Muita gente viu pela TV ou acompanhou pela mídia. No último dia 26, na Comissão de Infraestrutura do Senado Federal, a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, foi submetida a cenas de constrangimento explícito, discriminada como mulher e desconsiderada como a maior autoridade do setor no país e uma das mais respeitadas em todo o mundo. Convidada pela comissão para um debate sobre um tema que domina com propriedade, Marina se viu acuada por três senadores radicais da Região Norte, inclusive ouvindo de um deles que "o melhor seria que ela se recolhesse a seu lugar". Quem sentenciou a ministra a essa postura foi o senador Marcos Rogério, que preside a comissão. Para os próprios colegas de bancada, a colocação causou constrangimento. Errou a mão, exagerou na expressão.
A diferença entre a ministra Marina Silva e o senador em questão é pontuada por uma série de fatores. Entre eles, respeitabilidade internacional, conteúdo ideológico e conhecimento de causa. A postura da ministra em relação às questões de meio ambiente é conhecida em todo o mundo. E, gostem ou não de suas atitudes, não há como não respeitá-la pelo histórico e pelos apurados gestos de dedicação ao país.
O ambiente político, nessas circunstâncias, todos nós conhecemos. Claro que as manifestações do senador tinham o DNA a favor de sua região, e partir para o enfrentamento, a seu ver, corresponde à massa que o apoia. Marcos Rogério teve seu nome rejeitado quando se candidatou a governador do estado em 2022, mesmo amparado pelo padrinho Jair Bolsonaro. Juntos, os dois manifestaram posições radicais durante os debates da I da Covid-19. Que o Brasil inteiro viu, e até hoje se pergunta no que deu.
A deselegância e os gestos de agressividade contra a ministra Marina Silva, naquele dia nefasto, contaram também com a participação de coadjuvantes igualmente atuantes no quesito interesse regional, e não pouparam a ela cenas até então nunca vistas no ambiente tido sereno como o Senado Federal.
O senador Plínio Valério, de 70 anos e filiado ao PSDB, com todas as letras, disse respeitá-la como mulher, e não como ministra, numa afronta meio desproporcional ao que se espera de quem já caminha pela vida há algumas décadas. Bom lembrar que esse mesmo senador, num ado recente, anunciou em público que sua vontade era enforcar a ministra, tal seu repúdio às opiniões dela, já conhecidas.
Com a mesma proporcionalidade de indignação, o também veterano senador Omar Aziz, do PSD, visivelmente irritado, ironizou a ministra sobre suas atitudes pragmáticas em relação ao trabalho que sempre fez pelo Brasil. O que mais deixou os senadores com os nervos à flor da pele, com certeza, foi a personalidade forte e segura de Marina Silva notadamente quando ela, enfática, disse a todos eles que não era uma mulher submissa e ali estava para manifestar sua posição sobre problemas de interesse do país, e não visando interesses políticos.
Em resumo, o que se viu foi um peça teatral de mau gosto e um desfile indisciplinado de uma série de pessoas que deveriam dar exemplo de boas maneiras e postura ética respeitável. No Brasil e em todo o planeta, as questões relacionadas ao meio ambiente geram debates, polêmicas e, às vezes, até a adoção de medidas quase que insanas. E esse tema está longe de alcançar alguma coisa parecida com unanimidade de propostas. Quando a sociedade se depara com cenas grosseiras como as presenciadas justo no Senado Federal, não há como evitar a sensação de que ainda estamos bem distantes do que se espera como razoavelmente positivos sobre o tema. O que se viu ali foram manifestações de machismo, discriminação, arrogância e uma ferrenha defesa de interesses pessoais e políticos.
Uma lástima que assim seja. De se lamentar também as tímidas manifestações da presidência do Senado Federal sobre essa triste página anotada com pesar por aqueles de bom senso. Que o país é machista e discriminador, todos nós sabemos. Mas, vez por outra, alguns gestos de solidariedade ajudam a amenizar feridas abertas. Estranho também a frieza e a indiferença com que autoridades carimbadas do governo federal aceitaram os ataques à ministra Marina Silva. Alguns fizeram vista grossa e levaram a questão para o chamado jogo político. A maioria, como sempre faz, esbraveja na surdina e se cala em público. Marina que se defenda.