Saúde

Pré-eclâmpsia: a ameaça silenciosa que acometeu a cantora Lexa

Saiba mais sobre a pré-eclâmpsia, complicação grave na gestação e a principal causa de morte materna no Brasil. Diagnóstico precoce é essencial para a segurança de mãe e bebê

É uma condição grave que pode afetar a saúde da mãe e do feto -  (crédito: Reprodução/Freepik)
É uma condição grave que pode afetar a saúde da mãe e do feto - (crédito: Reprodução/Freepik)

Dor de cabeça persistente, visão turva e inchaço excessivo podem parecer sintomas comuns na gravidez, mas também podem indicar um risco fatal: a pré-eclâmpsia. Essa complicação hipertensiva, que afeta entre 1,5% e 7% das gestações, ainda é a principal causa de morte materna no Brasil, segundo dados da Federação Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo).

Se não for diagnosticada e tratada a tempo, pode evoluir para quadros graves como eclâmpsia — caracterizada por convulsões — e a síndrome HELLP, que compromete a função hepática e pode levar à morte da mãe e do bebê. “A única cura definitiva é o parto, mas o pré-natal adequado pode reduzir os riscos e garantir uma gestação mais segura”, alerta o ginecologista e obstetra Fabio os, professor da Universidade Católica de Brasília (UCB).

O que é?

A pré-eclâmpsia (PE) é uma doença específica da gravidez definida pela presença da hipertensão arterial, com ou sem proteinúria (excesso de proteína na urina), após a 20ª semana de gestação em mulheres previamente normotensas. Segundo Tatianna Ribeiro, ginecologista e obstetra da clínica Rehgio, os principais fatores de risco são:

• Histórico familiar ou pessoal da doença

• Primeira gestação

• Gravidez múltipla

• Obesidade e índice de massa corporal elevado

• Hipertensão crônica prévia à gravidez

• Diabetes e doenças autoimunes

• Doença renal crônica

• Idade materna abaixo de 18 anos ou acima de 35

• Histórico de trombofilias

• Gestação por reprodução assistida

Sintomas: quando se preocupar?

Os sintomas costumam aparecer a partir da 20ª semana, mas podem ser confundidos com desconfortos normais da gestação. Entre os mais comuns estão:

• Pressão arterial elevada (acima de 140/90mmHg)

• Inchaço excessivo, especialmente no rosto, nas mãos e nas pernas

• Dor de cabeça persistente

• Alterações na visão, como pontos brilhantes ou visão turva

• Dor na parte superior do abdômen

• Náuseas e vômitos

• Redução na quantidade de urina

Como é feito o diagnóstico?

O diagnóstico da pré-eclâmpsia é baseado na avaliação clínica e em exames laboratoriais. Os critérios incluem:

• Pressão arterial sistólica 140mmHg ou diastólica 90mmHg em duas ocasiões, com intervalo de pelo menos quatro horas

• Proteinúria (excesso de proteína na urina)

• Exames laboratoriais que avaliam a função hepática, renal e a contagem de plaquetas

“O diagnóstico precoce é essencial. O monitoramento da pressão arterial e exames regulares durante o pré-natal podem detectar sinais iniciais da pré-eclâmpsia antes que o quadro se agrave”, explicaTatianna Ribeiro.

Tratamento e manejo da doença

O tratamento varia de acordo com a gravidade da pré-eclâmpsia. “Os casos graves devem ser tratados em ambiente hospitalar, enquanto os leves podem ser acompanhados em consultório ou de forma ambulatorial, com a paciente em casa. Mesmo os quadros leves exigem acompanhamento mais frequente, com consultas e exames laboratoriais regulares, já que podem evoluir para quadros graves e requerer internação a qualquer momento.”, reforça Fabio os.

Quando a doença evolui para eclâmpsia (convulsões) ou síndrome HELLP (destruição das células do sangue, lesão hepática e baixa contagem de plaquetas), a paciente pode precisar de tratamento em UTI. “Nos casos mais severos, a internação é necessária para monitoramento contínuo da mãe e do bebê. A antecipação do parto pode ser a única opção para salvar a vida da mãe”, explica.

O médico acrescenta que, hoje, o parto prematuro é mais viável graças aos avanços da UTI neonatal, que possibilitam a sobrevivência de bebês muito prematuros. “Tradicionalmente, a interrupção da gestação visa salvar a vida da mãe em quadros graves. Atualmente, muitos bebês sobrevivem a partir de 23 ou 24 semanas, e o recorde mundial de sobrevivência é de 22 semanas e 3 dias.” No entanto, ele salienta que, quanto mais prematuro, maiores os riscos de morte ou sequelas. “A antecipação do parto visa proteger a vida da mãe diante de um quadro potencialmente letal”, informa.

Prevenção

Embora a pré-eclâmpsia não tenha uma causa única, algumas medidas ajudam a reduzir os riscos:

• Acompanhamento pré-natal rigoroso

• Controle da pressão arterial e do ganho de peso

• Alimentação equilibrada e prática de atividades físicas moderadas

• Redução do consumo de sal e cafeína

• Suplementação de cálcio e uso de aspirina em baixa dose (150mg/dia) para gestantes de alto risco

“O estudo Aspre demonstrou que o uso de aspirina reduz significativamente os casos graves de pré-eclâmpsia quando iniciado no primeiro trimestre da gestação. A medida pode ser fundamental para mulheres com histórico da doença”, explica Fabio.

Para Tatianna Ribeiro, a principal estratégia de prevenção é a identificação precoce do risco: “O rastreamento entre 11 e 13 semanas pode prever a probabilidade da doença e permitir intervenções precoces, evitando complicações tanto para a mãe quanto para o bebê”.

Consequências da pré-eclâmpsia para a mãe e o bebê

Se não tratada adequadamente, a pré-eclâmpsia pode levar a complicações graves:

Para a mãe:

• Eclâmpsia (convulsões)

• Síndrome HELLP

• Insuficiência renal ou hepática

• Edema pulmonar

• Acidente vascular cerebral (AVC)

• Descolamento prematuro da placenta

Estudos brasileiros e internacionais sugerem que gestantes com pré-eclâmpsia têm maior probabilidade de desenvolver hipertensão crônica no futuro. Outras pesquisas indicam maior risco de cardiopatias. No entanto, isso não é uma regra: quem teve pré-eclâmpsia não será necessariamente hipertensa, mas terá um risco aumentado.

Para o bebê:

• Restrição do crescimento intrauterino (RCIU)

• Prematuridade (parto antes de 37 semanas)

• Baixo peso ao nascer

• Sofrimento fetal

• Óbito fetal nos casos mais graves

É importante salientar que o desenvolvimento de pré-eclâmpsia em uma gestação anterior aumenta o risco em gestações futuras. “Os algoritmos atuais de cálculo de risco consideram o histórico de pré-eclâmpsia em gestações anteriores e em parentes de primeiro grau, como a mãe da gestante, como fatores de risco”, finaliza Fabio os.

Palavra do especialista

Quais são os impactos da pré-eclâmpsia na saúde cardiovascular da gestante, tanto durante a gravidez quanto a longo prazo?

Durante a gravidez, a pré-eclâmpsia age como um "acelerador" do envelhecimento vascular da mãe. Imagine que, em vez de envelhecer um ano, os vasos sanguíneos da gestante envelhecem um pouco mais em meses. Essa condição aumenta de duas a quatro vezes mais do que o normal o risco de desenvolver doenças cardiovasculares, como pressão alta, infarto do coração e acidente vascular cerebral (AVC), mesmo após a resolução da pré-eclâmpsia. Essa "marca" deixada pela pré-eclâmpsia exige atenção e acompanhamento médico contínuos.

Mulheres que tiveram pré-eclâmpsia correm maior risco de desenvolver hipertensão ou outras doenças cardiovasculares no futuro? Como esse risco pode ser reduzido?*

Sim. Esse risco é comparável ao de mulheres que fumam ou têm diabetes, por exemplo.Não desanime: é possível reduzir o risco! Mudar hábitos de vida, que incluem dieta equilibrada, prática regular de exercícios físicos e controle do peso. Basear-se em metas bem estabelecidas também ajuda! Aproveite as consultas médicas para monitorar a pressão arterial, o colesterol, a glicose, a função renal e outros fatores de risco — isso ajuda a identificar precocemente qualquer problema.

Há alguma recomendação específica para o acompanhamento cardíaco de mulheres que tiveram pré-eclâmpsia após o parto?

Sim. É recomendado que mulheres que tiveram pré-eclâmpsia façam acompanhamento médico regular com um cardiologista, idealmente no primeiro ano após o parto e, posteriormente, pelo menos uma vez ao ano. A prevenção é a palavra-chave!

Matheus Marques é cardiologista do Sírio-Libanês em Brasília.

*Estagiária sob a supervisão de Sibele Negromonte

 

Luiza Marinho*
postado em 23/02/2025 06:00 / atualizado em 23/02/2025 06:00
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