Religião

O cajado e a vara: o pontificado de papa Francisco

O uso da vara e do cajado marcaram o pontificado do papa Francisco. No cuidado do rebanho, o cajado é utilizado para resgatar ovelhas feridas. A vara, para corrigir as que buscam seguir caminhos tortuosos

Enquanto papa, Bergoglio assumiu o nome de Francisco (em homenagem a São Francisco de Assis). Seu pontificado foi marcado profundamente pela busca da simplicidade e de uma liderança servidora -  (crédito: Caio Gomez)
Enquanto papa, Bergoglio assumiu o nome de Francisco (em homenagem a São Francisco de Assis). Seu pontificado foi marcado profundamente pela busca da simplicidade e de uma liderança servidora - (crédito: Caio Gomez)

Gidalti Guedes da Silva professor doutor e coordenador dos cursos de teologia e filosofia na Universidade Católica de Brasília (UCB)

Nascido em 1936, em Buenos Aires, Jorge Mario Bergoglio ingressou na Ordem dos Jesuítas aos 22 anos, iniciando seus estudos em filosofia (na Argentina) e em teologia (no Chile). Em 1958, recebeu a Ordenação Sacerdotal, seguindo uma história proeminente de serviços eclesiásticos. Foi provincial dos jesuítas na Argentina (1973-1979), bispo auxiliar de Buenos Aires (1992), arcebispo de Buenos Aires (1998-2013) e foi nomeado cardeal em 2001.

Em 2013, após a renúncia do papa Bento XVI (Joseph Ratzinger), o cardeal Jorge Mario Bergoglio foi eleito papa, tornando-se o primeiro pontífice das Américas e o primeiro jesuíta. Enquanto papa, Bergoglio assumiu o nome de Francisco (em homenagem a São Francisco de Assis). Seu pontificado foi marcado profundamente pela busca da simplicidade e de uma liderança servidora. E ontem, 21 de abril de 2025, ele encerrou sua jornada de vida, após ter combatido o bom combate, concluído a corrida e guardado a fé.

Para compreendermos as marcas históricas deixadas pelo ministério do papa Francisco, recorremos a dois objetos utilizados pelos pastores de ovelhas nos textos bíblicos: o cajado e a vara. No cuidado do rebanho, o cajado era utilizado para resgatar ovelhas feridas, oferecendo acolhimento, cuidado e misericórdia.

Em seu último sermão, Francisco afirmou: "Cristo ressuscitou! Neste anúncio, encerra-se todo o sentido da nossa existência, que não foi feita para a morte, mas para a vida. A Páscoa é a festa da vida! Deus criou-nos para a vida e quer que a humanidade ressurja! Aos seus olhos, todas as vidas são preciosas! Tanto a da criança no ventre da mãe, como a do idoso ou a do doente, considerados como pessoas a descartar num número cada vez maior de países".

Essas palavras anunciam o desejo de que o Evangelho de Cristo seja assumido pelos cristãos em seus corações e nas suas atitudes. Francisco relembrou a Igreja e as nações de sua responsabilidade com os que sofrem, como todos que são excluídos e oprimidos. Por isso, enfatizou o compromisso de Jesus com os pobres, os famintos, os imigrantes, com aqueles que enfrentaram separação matrimonial, com as pessoas vítimas de abusos sexuais. Ele também visitou os presos, dando testemunho de sua fé no poder do Evangelho de resgatar vidas. Sem dúvida, essa foi uma ênfase no pontificado de Francisco.

Porém, além de fazer uso do cajado, da misericórdia, em seu ministério, papa Francisco fez uso da vara. Na prática dos antigos pastores de ovelhas, a vara era utilizada para corrigir as ovelhas que buscavam seguir caminhos tortuosos, reconduzindo-as ao aprisco. Além disso, era comum que a vara servisse para defender as ovelhas de predadores e espantar animais peçonhentos. Podemos concluir que o uso da vara significa a presença da disciplina e do rigor com os ensinos do Evangelho no cuidado pastoral dos cristãos, bem como significa o anúncio de uma palavra profética para despertar o conjunto da sociedade.

Nessa segunda ênfase de seu ministério, Francisco agiu com maior rigor diante de escândalos morais e da corrupção dentro da Igreja, contestou as injustiças cometidas na sociedade global, denunciou as políticas econômicas e as guerras, que geram morte e sofrimento a milhares de pessoas.

Nesse ponto, retomamos as palavras de seu último pronunciamento: "Quanto desejo de morte vemos todos os dias em tantos conflitos que ocorrem em diferentes partes do mundo! Quanta violência vemos com frequência também nas famílias, dirigida contra as mulheres ou as crianças! Quanto desprezo se sente, por vezes, em relação aos mais fracos, marginalizados e migrantes"!

O uso da vara e do cajado marcaram o pontificado do papa Francisco, deixando um legado histórico para os cristãos no século 21. Entretanto, essa ousadia de acolher e de contestar os rumos do mundo atual nem sempre foi bem compreendida. Pelo contrário, o pontificado de Francisco recebeu duras críticas, perseguições e falas ofensivas, proferidas por pessoas que não compreendem as implicações pessoais, sociais e ecológicas do Evangelho. 

Para encerrar, trazemos as palavras do professor doutor irmão Paulo Fossatti. Para ele, papa Francisco foi um "pastor incansável, homem de fé e construtor de pontes, que dedicou sua vida com intenso compromisso ao serviço do Evangelho, ao cuidado dos mais pobres e marginalizados, à promoção da paz e à defesa da Casa Comum". Quem tem ouvidos ouça!

 

Por Opinião
postado em 22/04/2025 06:00
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